Mais um texto claro e preciso do Jornalista Juremir Machado da Silva, publicado no jornal Correio do Povo, hoje dia 23 de novembro de 2012. Um artigo que vem bem a calhar porque ontem ocorreu a "Coroação", do ministro Joaquim Barbosa (o menino pobre que mudou o Brasil, antes necessitava-se de provas para uma condenação, hoje, não mais),
"A direita e a extrema direita brasileiras estão apaixonadas por Joaquim Barbosa.
Passaram a valorizar até o que sempre condenaram em outros: a questão racial.
Já o transformaram em candidato à presidência da República em 2014.
Por antipetismo visceral, imaginam ter encontrado, enfim, um candidato capaz de derrotar Dilma, Lula, o PT, a esquerda, o bolsa-família, o ProUni e até as cotas, que Barbosa apoia.
Outro dia, a Folha de S. Paulo publicou uma entrevista de Claus Roxin, um dos pais da teoria do domínio do fato, a doutrina esdrúxula usada por Barbosa para condenar sem prova material.
No meio de algumas coisas esquisitas, que se mostraram deturpadas pelo jornal, Roxin, que obviamente não se manifestou sobre o caso concreto do mensalão, disse uma coisa que não retirou como princípio doutrinário: a sua teoria não dispensa a prova material, não aceita apenas indícios.
Roxin, constrangido com a repercussão das suas declarações, pois deixou o STF numa saia justa, resolveu corrigir o jornal e, dilplomaticamente, sair da confusão. Alegou o que todos alegam quando falam demais e entram numa fria: que suas declarações foram tiradas do contexto e deturpadas. Pode ser. Deve ser. O essencial, porém, não se alterou, mesmo que afirmado em abstrato, como funcionam as teorias: sem provas, não. Só na evidência, não.
Alguns representantes da extrema direita vibraram achando que Roxin passou a legitimar o uso da sua teoria pelo STF. Não o fez. Da mesma maneira que, num contexto específico, sem a ver com o mensalão, afirmou o que vale também para o mensalão: não se deve julgar pelo clamor popular. A correção de Roxin, embora estratégica, repete o principal saindo do concreto.
A extrema direita fica eriçada.
Estava se sentido arrasada.
Imagina ter recebido oxigênio.
Não tem o menor interesse por corrupção.
Só quer manifestar seu horror a reformas sociais.
É pura ideologia.
Uma boa análise de discurso mostra que Roxin, em sua nota de correção, repete o que disse de essencial apenas remente as suas afirmações ao abstrato e não ao concreto.
Segue texto com as ressalvas de Roxin."
Roxin faz esclarecimento ao público sobre mensalão
É de conhecimento geral que o professor Claus Roxin esteve no Rio de Janeiro para receber um título de doutor honoris causa da Universidade Gama Filho e para participar do Seminário Internacional de Direito Penal e Criminologia ocorrido na Escola da Magistratura entre os dias 30 de outubro e 1o de novembro, em convite formulado por intermédio do professor Juarez Tavares. Por ocasião dessa visita, alguns meios de comunicação pediram a concessão de entrevistas, o que foi feito de bom grado. Em nome do professor Roxin e a pedido dele, na condição de seus alunos, gostaríamos de repassar ao público brasileiro os esclarecimentos feitos pelo professor em relação a alguns fatos divulgados nos últimos dias:
O professor manifesta, em primeiro lugar, o seu desgosto ao observar que a entrevista dada ao jornal Folha de São Paulo, concedida em 29 de outubro de 2012 e publicada em 11 de novembro de 2012,[1] ocasionou grande repercussão, mas em sentido errôneo. As palavras do professor, que se referiam apenas a aspectos gerais da teoria por ele formulada, foram, segundo ele, transformadas, por conta exclusiva do referido veículo, em uma manifestação concreta sobre a aplicação da teoria ao caso conhecido como “mensalão”. O professor declara, ademais, sua mais absoluta surpresa ao ler, no dia 18 de novembro de 2012, notícia do mesmo jornal, em que consta que ele teria manifestado “interesse em assessorar defesa de Dirceu”.[2] O professor afirma tratar-se de uma inverdade.
A redação final dada pela Folha de S.Paulo à referida entrevista publicada em 11 de novembro de 2012 é imprecisa, segundo o professor, as respostas não seriam mais do que repetições das opiniões gerais que ele já defende desde 1963, data em que publicou a monografia sobre “Autoria e domínio do fato” (Täterschaft und Tatherrschaft). A imprecisão deve-se ao título ambíguo conferido à matéria, que faz supor que houvesse uma manifestação sobre o caso ora em curso no Supremo Tribunal Federal brasileiro: “Participação no comando do mensalão tem de ser provada, diz jurista”. O professor não disse a seguinte frase a ele atribuída: “Roxin diz que essa decisão precisa ser provada, não basta que haja indícios de que ela possa ter ocorrido”, que é inclusive juridicamente duvidosa. A entrevista foi concluída com uma declaração posta fora de contexto, a respeito da necessária independência do juiz em face da opinião pública. Essa pergunta foi a ele dirigida não pela Folha de S.Paulo, e sim pelo magistrado aposentado Luiz Gustavo Grandinetti, na presença do professor Juarez Tavares, de Luís Greco e de Alaor Leite, estes dois últimos seus alunos. A Folha já havia terminado suas perguntas quando Grandinetti, em razão de uma palestra em uma escola para juízes (a EMERJ) que Roxin proferiria, indagou se havia alguma mensagem para futuros juízes, que, muitas vezes, sofrem sob a pressão da opinião pública. O professor respondeu a obviedade de que o dever do juiz é com a lei e o direito, não com a opinião pública.
A Folha, contudo, ao retirar essa declaração de seu contexto, criou, segundo o professor, a aparência de que ele estaria colocando em dúvida a própria isenção e integridade do Supremo Tribunal Federal brasileiro no julgamento do referido caso. A notícia do dia 18 de novembro vai além, afirmando: “O jurista alemão disse à Folha que os magistrados que julgam o mensalão ‘não tem (sic) que ficar ao lado da opinião pública, mesmo que haja o clamor da opinião pública por condenações severas’”. O professor recorda que nenhuma dessas ambiguidades existe na entrevista publicada pela Tribuna do Advogado do mês de novembro, entrevista essa concedida, inclusive, na mesma ocasião, à mesma mesa redonda, que a entrevista concedida à Folha.[3]
O professor declara tampouco ter interesse em participar na defesa de qualquer dos réus. Segundo ele, não só não houve, até o presente momento, nenhum contato de nenhum dos réus ou de qualquer pessoa a eles próxima; ainda que houvesse, o professor comunica que se recusaria a emitir parecer sobre o caso. Em primeiro lugar, o professor desconhece o caso quase por completo. Em segundo lugar, afirma que, pelo pouco que ouviu, o caso não desperta o seu interesse científico. O professor recorda que interesses políticos ou financeiros lhe são alheios, e que não foi sobre tais alicerces que ele construiu sua vida, sua obra e sua reputação. Por fim, o professor declara que não se manifestou sobre o resultado da decisão e que não tem a intenção de fazê-lo. Além disso, não está em condições de afirmar se os fundamentos da decisão são ou não corretos, sendo esta uma tarefa que incumbe, primariamente, à ciência do Direito Penal brasileira.
Estes são os esclarecimentos que o professor Claus Roxin gostaria de fazer ao público brasileiro, na esperança de que, com a presente nota, possa pôr um fim a essas desagradáveis especulações.
Munique, Alemanha, 18/11/2012.